segunda-feira, 23 de junho de 2014

Amaraladas na Copa 14 - Dez


O vexame é das maiores forças vivas da natureza. Um grande vexame é capaz de feitos extraordinários, de desgraças colossais ou parir maravilhas maravilhosas, atômicas, sobrenaturais até.
O problema do vexame é sua digestão. Alguns não aguentam o batráquio, que costuma ser venenoso e ter espinhos, e caem na mais funda tristeza, solapam, avestruzam. Mas outros são capazes de tirar do evento um gosto de chance, de mais um gole, um riso gordo. Quem já viveu um vexame de proporções bíblicas, e todos humanos já vivenciaram ao menos um, sabe que o mundo pode reservar situações de prazer imenso mas, também, de pavor, medo e vergonha.

Numa copa há muitas chances de pequenos vexames. Uma escorregada, uma falha defensiva, um chute de pé muchibento, uma peste na arbitragem. Há também as chances de vexames médios. E há a oportunidade ímpar do vexame excepcional, daqueles capazes de fustigar a auto estima de forma excruciante, dolorosa, funda, futura cicatriz.

A verdade é que dá azar pensar nisso. Mas não deixa de ser deliciosamente furtivo, como que experimentar o proibido, imaginar o que poderia acontecer com um contra golpe fatal africano, de um camaronês com vestes e foice, ceifando com um gol inesperado os ares para se respirar. E nós todos de ouvidos e olhos no jogo do México, torcendo para que lá não aconteça o resultado impossível que nos desclassificaria, primeira fase em punhos, da copa organizada em casa. Porque Marin mereceria este desfecho, com toda a tintura no cabelo, com todo o laquê. Porque muitos de nossos jogadores mereceriam esta mácula, porque confundem as coisas e porque ignoram camisas, desejos, suores e anseios. Porque Parreira e Felipão, todos senhoures de bons modos, também mereceriam uma liçãozinha contra a empáfia e a subserviência.

O problema é que seria mais um vexame e só. Sim, um vexame pecaminoso, universal. Mas na nossa viperina estrutura de castas este vexame sobraria só para os bares, as lágrimas das crianças, o mau humor no dia seguinte. Não seria a imposição da necessária guilhotina nessa corja que toma conta do futebol e que transforma nossas bolinhas de gude e figurinhas de bafo em simples anotações de livro de caixa, entrada, despesa, resultados, balanço. 

Portanto, seria um vexame e nada mais.

Assim sendo, que não tenhamos vexames tão gigantescos. Porque servirão só de dor aos cotovelos já feridos. E que ao menos escalem Hernanes, em qualquer posição, que uma copa sem sãopaulinos é como cerveja sem álcool.


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