quinta-feira, 24 de abril de 2014

Paralelas Trinta e Oito

Rússia e Coréia do Sul. Arena Pantanal. Os russos, com seu novo império a brotar, e a Coréia do Sul, com sua velha cicatriz. Os jogos de uma copa tem sempre histórias paralelas, que se multiplicam no infinito. Dos garotos ouvindo o jogo numa saída de escola. Das garotas colando figurinhas em álbuns. Será que na Rússia tem figurinhas da Copa? Confesso plenamente que se fosse a União Soviética eu iria torcer muito. Para a Rússia, não. Fico com a Coréia, sua vibrante torcida, seu uniforme multicolorido – só me faltava eles entrarem de branco na peleja...

Talvez se a União Soviética tivesse ganho copas do mundo de futebol o tolo do Mikhail nunca tivesse existido... penso bastante nisso. No mundial que deveria ter sido de Yashin. E não foi. É absolutamente verdadeira a constatação de que o regime soviético foi um pesadelo. Principalmente durante Josef e depois. Mas não é nisso que penso. A reflexão é sempre naquilo que poderia ter sido. Da Estação em diante. Tivessem ganho a copa do mundo seria diferente, aposto. Porque a copa é um gol de Oscar contra Dino Zoff. E quem viu aquela bola entrar sabe que é possível mudar a cor do mundo. A roda toda.

Também sonho com o gol da Coréia contra a Alemanha, em 2002. Sim, porque se é verdade que contra Espanha e Itália os sul coreanos tiveram uma mãozinha da arbitragem, também é fato que nenhuma torcida merecia tanto uma copa do mundo como aquela maluca torcida coreana. Com curiosidade, busquem lá os arquivos do VocêTubo, das matérias de periódicos. A Coréia vibrava tanto com a seleção que seriam capazes de dinamitar os muros todos duma só vez com um gol daquele zaqueirão que hoje é o treinador dos caras.


Mas o fato inexorável é que a copa do mundo de hoje não tem soviéticos nem a torcida sul coreana em massa, cantarolando plenos pulmões. O jogo deve ser mais um daqueles que completam tabelas de copa, que servem para casas de apostas, que derrubam bolões. Que lá fora do estádio está um país que perdeu a imensa possibilidade de criar novas rodas, de vibrar torcidas para derrubarem muros, de olhar pra frente com gol. Tudo virou uma enorme e imensurável nuvem de mundo adulto, melancólica, dura e fria.


A sorte é que os coreanos não estavam nem aí para as minhas digressões diletantes. E massacraram os russos, com três gols de Park. Aposto e ganho que se aquele time da Coréia do Norte tivesse os irmãos do Sul em 66, na copa do apito inglês, até hoje o mundo seria outro, com outra geografia. Inclusive no futebol.


Rússia 0 x 3 Coréia do Sul
17/06/2014 – Arena Pantanal, Cuiabá.