segunda-feira, 7 de julho de 2014

Amaraladas na Copa 14 - XXVI


Talvez a beleza desta Alemanha e desta Holanda, nas semifinais do Mundial, esteja numa leveza estranhamente inquietante para nossos padrões chauvinistas no trato com o ludopédio.

Carregamos, brasileiros e argentinos, uma culpa infinita nas costas. E por isso inventamos as concentrações, com suas regras, seus pactos, suas futricas. Carregamos a responsabilidade de sermos um time, mas uma nação. Convenhamos, esse caldo desandar é mais fácil que creme de leite passar do ponto na hora de esquentar o estrogonofe. Basta escapulir atenção e pronto.
Deixamos fazer crer e acreditar que uma vitória no futebol - e, em especial, num mundial - é uma efeméride ainda maior que nossas próprias civilizações. O futebol redimirá nossos pecados. 

Já alemães e holandeses desfilam suas alegrias pelas praias da Bahia e do Rio de Janeiro. Tiram fotos. Cantam hinos de clubes brasileiros. Dançam. Trazem crianças para o campo de jogo. Se divertem. Sorriem. Estripulias. Cantam. Há uma alegria ali, que provavelmente um dia foi nossa, pela disputa em si, como num jogo de traves improvisadas. Sim, devem estar pressionados e o futebol, essencialmente na Alemanha, é, sim, uma questão de estado. Mas o futebol é mais um elemento no caldo. Um tempero. Para nós, não. 

Por mais que Gaal seja arrogante, prepotente, há uma diferença com as bigodadas de Scolari. Felipão trata a questão como um problema de estado, os traidores, os desgraçados, os do contra. Gaal é só chato, mas trata do futebol, espinafra a fifa, coloca o pingo no i, briga com os jornalistas, mas não temos a pátria em questão. Há um limite. Um limite interessante se conseguirmos observar de longe. As diatribes do treinador holandês dentro do campo do jogo tem um tipo de cálculo em que é o jogo que importa, tabuleiro. Nossas peripécias são outras: não nos esqueçamos, nunca, da bola arremessada pelo nosso banco de suplentes em direção ao campo do jogo, para atrapalhar uma jogada, para ter duas bolas em campo. Não podemos perder, em hipótese alguma.

A Alemanha, sisuda, sorri. O Brasil, que dizem alegre, sofre um calvário digno de um dramalhão, intenso, mas perverso. Sim, os hermanos estão no nosso barco também. Talvez esta intensidade seja um segredo e nos faça produzir outros tipos de combinações orgânicas estranhas aos demais praticantes do desporto que redundem em paixão no campo, aquela dedicação que trará um gol improvável, a superação, a vaga nas finais. Mas deveríamos aprender com os terceiro e quarto colocados do Mundial e buscar esta leveza. Com paixão e leveza poderíamos flutuar, voar e nunca mais perder um mundial. O problema é saber quem terá esta receita antes, se brasileiros ou argentinos... E, porque não, os uruguaios.

Não cogito a hipótese de ser outra final que não a de Brasil e Argentina. Há um enredo desenhado que exige sofrimentos, agonias, dores. A única pulga que me azucrina é que Alemanha e Holanda estão em campo com doces lascividades, tão belamente inspiradoras. 

O perigo é este feitiço: o lúbrico sempre e sempre pode produzir encantamentos...



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