sexta-feira, 22 de junho de 2018

Os orixás da bola



O primeiro gol da Nigéria, na partida de hoje contra a Islândia, é a explicação mais evidente das razões que fazem o futebol ser imortal. Até o milésimo de segundo anterior ao início da correria do lateral - ou ponta, meia, atacante, zagueiro, tanto faz - que lançou a bola para o domínio de Musa, na área islandesa, noventa por cento do mundo imaginava que a Islândia acabaria achando seu golzinho, se fecharia em copas, quase carimbando a vaga para a segunda fase.

Ocorre que a bola tinha outros planos. Gosto de pensar na redonda como um ente mágico. Mas inerte, quase sempre. Mas um carinho, um afago, um sopro, uma canelada, uma matada no peito ou uma desengonçada cabeçada podem despertá-la. Desconfio que foi o que ocorreu quando o jaqueta onze na Nigéria se lançou ao universo em direção a linha de fundo. O lançamento. A parte de fora do pé de Musa. E ela se recolhendo ao campo do chute, matreiramente, dando um quique que a deixou exatamente da ponta da chuteira do sete africano. E vai descansar gostosa no fundo da meta, para um mundo atônito. A beleza, plástica, mas do efêmero: A Nigéria voltava para a copa, trazia a Argentina de volta ao baile e, trazendo a Argentina, acolhe novamente a Messi. A Nigéria, que ao lado dos Camarões de Roger Milla, embala a mais tempo o sonho de um caneco inédito africano. Se a dança senegalesa emociona e nos redime, a Nigéria de volta ao sonho é um parque de diversões onírico. Com um gol desses... um gol que explica tudo.

A grande copa de Neymar seria a de 2010. Lá naquele antes, em terras sulafricanas, o menino já ensaiava seus passos de virtuose e ballet no Santos de Pelé. Não foi convocado, porque Dunga, um dos melhores volantes volantes que o mundo já viu, é um eterno ressentido - queria ter sido meia desconfio. O time de 2010 chegou na África do Sul super favorito. Ganhou de todo mundo na véspera. Com contragolpes fatais. Mas no torneio foi mal, muito mal. A contusão de Kaká matou o esquema de Dunga e sem Kaká o time se revelou excessivamente quadrado. Neymar ali seria a chance das geometrias, era um ilustre desconhecido e faria do mundo mais um zagueiro joão. Hoje,oito anos depois, Neymar é mais conhecido e manjado que muito artista de cinema americano, desfila, se exibe, demanda. É brilhante, mas não tem mais aquele frescor que o deixava incólume perante as vicissitudes e as labaredas do mundo, as nossas e, também e também, as dele.

Um ano antes da copa de 2010, na Nigéria, num mundial de quase meninos, chamado oficialmente de Sub/17, houve uma partida entre Suíça e Brasil, no Estádio Nacional de Abuja. O Brasil tinha Alisson no gol, tinha Casemiro, tinha Coutinho e tinha Neymar. Um timaço. A Suíça tinha Seferovich, Rodriguez e Granit Xhaka, que são titulares do time nesta copa do mundo e estiveram em campo no empate inaugural da semana passada. A partida acabou 1x0 para a Suíça, o Brasil foi desclassificado na fase de grupos. 

Aliás, o gol de Xhaka, hoje contra a Sérvia, foi um golaço de marca, um pelotaço com raiva de fora da área. Daqueles gols que ecoam. A Suíça pode não ir longe nesta copa, mas em 2009, foi quem levantou a taça. Vencendo a Nigéria na finalíssima.

22 de junho, 2018. Brasil e Costa Rica. Suíça e Sérvia. Islândia e Nigéria.






  

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