Descendo as escadas de meu avião no
Santos Dumont, o mais charmoso aeroporto do mundo suspiro e me
pergunto pela centésima vez se aquela é a primeira jornada até a
realização de um de meus maiores sonhos: testemunhar uma final de
Copa do Mundo entre o escrete canarinho e nuestros hermanos
argentinos?
Sem tempo para perder, me mandei para
o velho Adonis, afinal de contas, o Rio, mesmo no frio é quente. O
Benfica, onde o Rio é mais português, fervilhava de gente naquela
tarde, e eu, trajado com a minha camiseta do meu querido Rosário
Central tratei de me perder numa mistura de carregadores da CADEG (um
deslumbrante entreposto de secos e molhados) de folga, velhos
frequentadores e um grupo de peladeiros do São Cristóvão, campeão
carioca de 1926. Caldeiretas, bagaceiras e bolinhos de bacalhau eram
consumidos e eu tentava me lembrar que a minha razão de estar lá
era cobrir a estréia da poderosa Argentina contra a estreante Bósnia
e Herzegovina, no fim de tarde, no templo-mor do futebol.
Com o torpor causado pelo engasgagato
português que bebia, flashes vinham à minha cabeça sobre
esquadrões argentinos repletos de heróis que eu já tinha visto em
outras copas, que tinham me emocionado e que num lapso de
segundo.....tinham naufragado. Maradona, Caniggia, Redondo, Verón,
Saviola, Aimar, Simeone, Batistuta, entre outros, sempre eram
soberbos, divinos, até serem derrubados por algo aparentemente
inexplicável.
O
panorama agora era bem menos alentador; Messi era basicamente toda a
esperança de um time que tinha o inseguro Romero no gol, a defesa
sendo sustentada pelo jurássico Coloccini, um meio de campo razoável
com Mascherano, Gago, Di Maria e Pastore e no ataque, ele, Lionel e o
vascilante Kun Aguero.
Quando o cheiro da bagaceira já era
insuportável, tomei o rumo do velho Maraca com direito a uma
paradinha na Salete para comer uma empadinha de camarão e tirar a
nhaca. Entrando no bar escuto uma saudação “canalla cagón”,
bradada por um argentino imenso com a camisa do Boca no meio de um
bando enlouquecido. O susto foi aquietado por um largo sorriso e um
abraço caloroso. Agora eu era parte de uma trupe que ia junta para o
estádio.
Uma
massa humana bizarra se formava e se transformava numa mancha imensa
na frente do Maraca. De todas as partes surgiam camisetas e adereços
de Boca, River, Independiente, Racing, Quilmes, Vélez e muitos
outros times, criando um mosaico humano fabuloso, que cantava musicas
como mantras.
Dentro do estádio, uma curiosidade
natural com a seleção da Bósnia e Herzegovina, a única seleção
caloura deste mundial; a seleção de um país surgido após uma
guerra genocida ainda na década de 90 e que por isso povoa mais o
imaginário de todos com sua dor do que com a sua beleza.
Começa o jogo e o que se vê é uma
seleção Bósnia marcando de maneira muito forte a seleção
Argentina, que permanece encurralada por 20 minutos em seu campo de
jogo até que em uma troca de passes entre Messi e Gago, Messi deixa
Di Maria livre para fazer Argentina 1x0. Mal recomeça o jogo e, numa
arrancada brusca, Lionel sente uma forte fisgada e tem que ser
substituído por Lavezzi. Pressão fortíssima da Bósnia até que
num cruzamento perfeito, Dzeko sobe mais do que Zabaleta e empata o
jogo, 1x1. Comemoração tímida da maior parte do estádio,
brasileira e uma centena de bósnios.
Rola o segundo tempo e a Argentina,
mesmo sem Lionel, com o alento de sua torcida, toma conta do jogo.
Mascherano marca duramente Pjanic e a bola rola de pé em pé no meio
campo platino, evocando por alguns instantes os espíritos de
Lousteau, Di Stéfano e Pedernera. Faltava, entretanto o gol, a
finalização, o cara. Nessa hora, num lance apoteótico, recebendo a
bola de Lavezzi, Aguero entortou dois defensores e fuzilou a meta
bósnia marcando 2x1 para a Argentina. Quatro minutos mais tarde,
aproveitando uma bola mal espalmada pelo arqueiro bósnio, o mesmo
Kun tocou com tranqüilidade para sacramentar o resultado final de
3x1 e, em seguida se dirigiu para a tribuna em que estava seu
ex-sogro e desafeto Maradona, fazendo sinal de silêncio. O jogo, no
fundo tinha sido mequetrefe, mas a ordem natural dos fatos não tinha
sido mexida.
Final do jogo e a torcida cantava a
plenos pulmões, parecendo nem se lembrar mais da tíbia situação
de seu maior ídolo, Messi. O mantra tomava conta do Maracanã e,
enquanto os brasileiros iam embora, acabei me encontrando com o meu
desconhecido amigo com a camisa do Boca e sua turma. Descobri que se
chamava Juan Domingo e combinamos de ir festejar na feira de São
Cristóvão.
A
noite já corria, o forró tocava com força, os argentinos cantavam,
bebiam e enfiavam a cara na cachaça, quando eu percebo a chegada de
dez sujeitos vestidos com a camisa do Vasco da Gama que, pasmem, se
juntaram à bagunça e conosco festejaram. O mundo, meus amigos, tem
jeito sim.
Resultado
final : Argentina 3x1 Bósnia e Herzegovina
(Di Maria, Aguero, duas
vezes e Dzeko) . Maracanã.
15.06.2014
Álvaro
Larrabure Costa Corrêa
(Um dia poemaram para nosso Ogrito, lá nos Bolonistas... Um cordel tão lindo quanto o cara: http://osbolonistas.zip.net/arch2005-11-01_2005-11-30.html#2005_11-18_16_52_04-5048921-29
A capa do "Olé" é o Messi....
ResponderExcluirFlusaram o Messi?
ResponderExcluirEspetacular o cordel.