Uma festa de arromba sempre é povoada
por uma fauna composta por tipos diversos que compõe a história
final que vai ser contada, por muitas gerações, sobre aquele
pequeno espaço de tempo. Dos eternos candidatos a reis e rainhas do
baile, àqueles de quem pouquíssimos lembram a presença, existe
toda uma constelação de tipos improváveis, belos, extravagantes,
enfim marcantes.
Chegando à capital potiguar, terra do
monumental Câmara Cascudo e do guerreiro time do Alecrim, percebi
que os meus 20 anos afastado dessa boa cidade tinham me transformado
num alienígena. Então saquei uma anotação do bolso e rumei para a
barraca do carangueijo na Ponta Negra.
Em
folhas de papel manchadas pelo óleo do peixe frito comecei a
esquadrinhar algumas linhas: o México, paixão minha desde moleque,
parecia dotado de uma bendição que no fundo era uma maldição;
vamos lá: com quinze participações em Copas (fato que a torna a
quinta seleção que mais participou do certame), o México era
aquele cara da turma que jamais furava, não ameaçava ninguém (os
expoentes-mór Hugo Sanchez e o longevo Carbajal não me deixam
mentir), sempre trazia a seleção mais animada e agradável de cada
Copa e nas duas vezes que tratou de organizar o certame, o fez no
mais lindo dos palcos, o Azteca e elevou definitivamente Pelé e
Maradona ao grau mais alto de suas carreiras. O México era o cara
mais legal da turma.
Por
outro lado, Camarões não merecia uma nota menor; em sua sétima
participação, Camarões inaugurou nas nossas cabeças o encanto e o
temor de que todo um continente cor de ébano estava chegando com
suíngue, malícia e habilidade e que o futuro do futebol jamais
seria como era até então. Isso em 1990, quando o esquadrão do vovô
Milla derrubou, de cara, os argentinos, bateu a carteira do
histriônico Higuita e fez o mundo sonhar por muitos dias.
Enfim, se o México é eternamente o
cara legal da turma, Camarões é um daqueles novatos ousados,
abusados do grupo, daqueles que todos sabemos que um dia pode virar o
rei do baile.
Rumo para o salão de bailes, digo, a
Arena das Dunas e a frente do estádio é uma festa só; sombreros
mexicanos, perucas e buzinas fazem um torto arranjo musical com
tambores africanos de camaronenses e outros africanos que se juntaram
à festa, enquanto a população de Natal vibra generosamente o sonho
aguardado por muitos anos.
Começa o jogo e o panorama para os
mexicanos é muito menos festivo do que parecia há instantes atrás;
classificada graças a dois goles sobrenaturais dos gringos, que os
mandaram para a repescagem, a “Tri” era hoje um time cheio de
marcas, retranqueiro, brigado com seus maiores craques, Chicharito e
Giovanni dos Santos. Os Camaronenses, depois de terem começado a sua
caminhada com uma manobra “fluminística” que eliminou o Togo e
terem se reconciliado de vez com Eto´o jogava com leveza, logo
arrebatando os corações potiguares.
O
jogo travado em seu meio de campo e cheio de faltas parecia rumar
para o fim, quando ele, Samuel Eto´o achou um espaço após uma
finta desconcertante no veterano Rafa Márquez e fuzilou; Camarões
1x0 México. Fim do primeiro tempo.
Intervalo de jogo e foi anunciada a
entrada do mascarado Chicharito. Poucos aplausos entre os mexicanos.
Começa o segundo tempo e o que se vê
é uma partida de um ataque versus uma defesa. Os africanos avançam
como guerreiros, enquanto os mexicanos totalmente retraídos tratam
de evitar o pior. O travessão mexicano é impiedosamente alvejado,
mas pela Nossa Senhora de Guadalupe, permanece inexpugnável. O calor
castiga as duas seleções.
Aos
28 minutos do segundo tempo, num rápido contra-ataque, Paul Aguilar
toca para Raul Jimenez, que avança e tabela com Peralta, que bate
sem defesa para o goleiro camaronense. Empate em 1x1.
Reiniciado o jogo e reiniciado o
massacre camaronense, impiedoso. Idrissou, Eto´o, Emanah, parecem
gladiadores arremetendo contra uma defesa mexicana perto da exaustão,
até que aos 42 do segundo tempo, o inacreditável.....Peralta tocou
para Pena, que viu Chicharito livre e lhe mandou um passe
açucarado....la “arvejita” passou batido por Song num lapso de
segundo e tocou na saída do goleiro Assembe, para de maneira
fantasmagórica virar o jogo para México 2x1 Camarões. Estava
finalizado o jogo.
Imparcial é o raio que o parta e eu
que já não conseguia conter as minhas lágrimas, fui prontamente
acolhido por um bando de mexicanos incrédulos, exaltados, também
com lágrimas nos olhos, ao que disse a um deles: “ustedes no
decian siempre que “jugavan como nunca y perdian como siempre”,
bien, hoy ustedes no jugaran nada y ganaran como nunca”. Abracei
fortemente a todos e me fui. Arriba México Cabrones!!!
Resultado
final : México 2x1 Camarões (Peralta, Chicharito e Eto´o) . Arena
das Dunas. 13.06.2014
Álvaro
Larrabure Costa Corrêa
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