sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Las cosas cambian




Uma festa de arromba sempre é povoada por uma fauna composta por tipos diversos que compõe a história final que vai ser contada, por muitas gerações, sobre aquele pequeno espaço de tempo. Dos eternos candidatos a reis e rainhas do baile, àqueles de quem pouquíssimos lembram a presença, existe toda uma constelação de tipos improváveis, belos, extravagantes, enfim marcantes.

Chegando à capital potiguar, terra do monumental Câmara Cascudo e do guerreiro time do Alecrim, percebi que os meus 20 anos afastado dessa boa cidade tinham me transformado num alienígena. Então saquei uma anotação do bolso e rumei para a barraca do carangueijo na Ponta Negra.

Em folhas de papel manchadas pelo óleo do peixe frito comecei a esquadrinhar algumas linhas: o México, paixão minha desde moleque, parecia dotado de uma bendição que no fundo era uma maldição; vamos lá: com quinze participações em Copas (fato que a torna a quinta seleção que mais participou do certame), o México era aquele cara da turma que jamais furava, não ameaçava ninguém (os expoentes-mór Hugo Sanchez e o longevo Carbajal não me deixam mentir), sempre trazia a seleção mais animada e agradável de cada Copa e nas duas vezes que tratou de organizar o certame, o fez no mais lindo dos palcos, o Azteca e elevou definitivamente Pelé e Maradona ao grau mais alto de suas carreiras. O México era o cara mais legal da turma.

Por outro lado, Camarões não merecia uma nota menor; em sua sétima participação, Camarões inaugurou nas nossas cabeças o encanto e o temor de que todo um continente cor de ébano estava chegando com suíngue, malícia e habilidade e que o futuro do futebol jamais seria como era até então. Isso em 1990, quando o esquadrão do vovô Milla derrubou, de cara, os argentinos, bateu a carteira do histriônico Higuita e fez o mundo sonhar por muitos dias.
Enfim, se o México é eternamente o cara legal da turma, Camarões é um daqueles novatos ousados, abusados do grupo, daqueles que todos sabemos que um dia pode virar o rei do baile.

Rumo para o salão de bailes, digo, a Arena das Dunas e a frente do estádio é uma festa só; sombreros mexicanos, perucas e buzinas fazem um torto arranjo musical com tambores africanos de camaronenses e outros africanos que se juntaram à festa, enquanto a população de Natal vibra generosamente o sonho aguardado por muitos anos.
Começa o jogo e o panorama para os mexicanos é muito menos festivo do que parecia há instantes atrás; classificada graças a dois goles sobrenaturais dos gringos, que os mandaram para a repescagem, a “Tri” era hoje um time cheio de marcas, retranqueiro, brigado com seus maiores craques, Chicharito e Giovanni dos Santos. Os Camaronenses, depois de terem começado a sua caminhada com uma manobra “fluminística” que eliminou o Togo e terem se reconciliado de vez com Eto´o jogava com leveza, logo arrebatando os corações potiguares.

O jogo travado em seu meio de campo e cheio de faltas parecia rumar para o fim, quando ele, Samuel Eto´o achou um espaço após uma finta desconcertante no veterano Rafa Márquez e fuzilou; Camarões 1x0 México. Fim do primeiro tempo.
Intervalo de jogo e foi anunciada a entrada do mascarado Chicharito. Poucos aplausos entre os mexicanos.

Começa o segundo tempo e o que se vê é uma partida de um ataque versus uma defesa. Os africanos avançam como guerreiros, enquanto os mexicanos totalmente retraídos tratam de evitar o pior. O travessão mexicano é impiedosamente alvejado, mas pela Nossa Senhora de Guadalupe, permanece inexpugnável. O calor castiga as duas seleções.
Aos 28 minutos do segundo tempo, num rápido contra-ataque, Paul Aguilar toca para Raul Jimenez, que avança e tabela com Peralta, que bate sem defesa para o goleiro camaronense. Empate em 1x1.

Reiniciado o jogo e reiniciado o massacre camaronense, impiedoso. Idrissou, Eto´o, Emanah, parecem gladiadores arremetendo contra uma defesa mexicana perto da exaustão, até que aos 42 do segundo tempo, o inacreditável.....Peralta tocou para Pena, que viu Chicharito livre e lhe mandou um passe açucarado....la “arvejita” passou batido por Song num lapso de segundo e tocou na saída do goleiro Assembe, para de maneira fantasmagórica virar o jogo para México 2x1 Camarões. Estava finalizado o jogo.
Imparcial é o raio que o parta e eu que já não conseguia conter as minhas lágrimas, fui prontamente acolhido por um bando de mexicanos incrédulos, exaltados, também com lágrimas nos olhos, ao que disse a um deles: “ustedes no decian siempre que “jugavan como nunca y perdian como siempre”, bien, hoy ustedes no jugaran nada y ganaran como nunca”. Abracei fortemente a todos e me fui. Arriba México Cabrones!!!

Resultado final : México 2x1 Camarões (Peralta, Chicharito e Eto´o) . Arena das Dunas. 13.06.2014

Álvaro Larrabure Costa Corrêa

quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

UM CORPO QUE CAI


Fuga espetacular de Paulo Henrique. Carro do suposto assassino de Oscar no meio do Tietê, vazio. Vivo ou dissolvido nas águas do rio? Ausência do técnico na coletiva. Paradeiro desconhecido. Presidente da Confederação estatelado na Rua Victor Civita. Internado.
Os acontecimentos prenunciavam uma partida sob clima pesado no Castelão. Daí minha surpresa ao ver a seleção jogar de forma tão leve e prazerosa. As ausências acrescentaram muito ao time. A torcida uma festa só. Contra todas as probabilidades, até eu estava feliz e sereno. O México tampouco ficou de fora do clima alvissareiro. Conjunção tão inusitada de fatores levou a um não menos inusitado placar: Brasil 5 x 5 México. Vaga, só no terceiro jogo. Veloz para o aeroporto. Bom-humor em Fortaleza não dura muito.


___________

Ps: Notas de rodapé, por Amaral.

 Brasil 5X5 México - (não temos a ficha técnica dos goles... foi tão fantástico que ninguém anotou) - 17.12.2014 - Castelão, Fortaleza.

Alguém, um dia, escreveu sobre o Zécons, o autor deste relato surrealista do prélio da canarinho...:
http://osbolonistas.zip.net/arch2005-11-01_2005-11-30.html#2005_11-17_17_46_48-100696263-29

Alguém impedido ou a vaca foi para o brejo?


quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Se foi só isso... tá bom...


Estou aqui. Quarto de hotel. Olhando a espátula do ventilador. E aquele barulhinho.... trac...trac...traaaac....trac....traaaac... turk. E de novo. Não sei como vou sair daqui, confesso. Tudo o que eu comi de torresmo, tudo o que eu tomei de Salinas e afins, tudo o que eu gritei, dancei, pulei. Sim, até sambei ao fim da noite quebrando pratos. Pratos...

No canto, nestas cômodas que tem bíblia, jaz um copo de sal de fruta. Quando o resto do pó fica ali a te denunciar. A golpear com lâminas de retrogosto. Só sei que quando percebi encontrei o tíquete do bolso, o tíquete do jogo. Tinha ido a Beagá para Grécia e Colômbia. Tinha ido, a bem da verdade, rememorar idas e vindas. Tinha ido ao torresmo, santo. Confesso outra cousa: assim como Gil e Dominguinhos, não sei amar sem torresmo. E quando esses exageros se misturam, ainda mais numa copa do mundo, há que dar relevo ao óbvio: algo sairá em ressaca. E cerveja gelada...

Quase perco a hora. Também, que raios duplos fazem alguém imaginar um jogo as treze horas, treze horas... E estava eu numa conversa boa, de bar, que fui ficando, ficando, ficando. Mas, repentinamente, sei lá como, Mineirão. Estava lá. Lotado. 

O de sempre: Vaias para todas as autoridades presentes. E uns gritos mais pesados aqui e ali contra um outro que aparecia no telão. Mas o estádio foi literalmente sacudido – e, sim, o bom Mineirão voltou a tremer como nas tardes de Reinaldo ou de Nelinho – quando a cabeleira santa de Valderrama surgiu nas telas. Valderrama descobriu que sua popularidade por aqui é capaz de muito. Do melhor sítio da internet sobre futebol, “Impedimento”, que tem ele estampado nas logos. E de centenas de camisetas espalhadas pelo estádio. Alias, do lado de fora, camelôs vendiam a camiseta por módicos reais. E os mineiros, daquele jeito deles, souberam fazer o espetáculo: do lado de fora, derrotada a Fifa, as lanchonetes de comida rápida, os refrigerantes, os patrocinadores, o diabo a quatro. E dentro do Mineirão.... um trem doido.

A torcida colombiana era maior e mais ruidosa. Poucas bandeiras da Grécia. Evidências geográficas e econômicas. E a Colômbia tinha Falcão Garcia, candidato a craque da copa. E ele foi logo dando as credenciais: Bola na área e num sem pulo de cinemascope um petardo varava a cidadela grega. Um a zero. Não deu tempo para nada, um golpe no fígado.

Mas a retranca grega era digna. E o tik-tak dos colombianos... daquela beleza que não leva a nada... enjôo. Sono. Toque daqui, toque dali. Samaras, empate. Sempre ele, numa bola que sobrou de um chutão da defesa. Falcão, outro golaço. Desta feita, senhoures e senhouras, o cidadão conseguiu desvencilhar-se de Sócrates, Platão e todos os filósofos juntos, com um toque de letra. No ângulo. Fim do primeiro tempo e o gol espetacular deixou todos de queixo. Caídos.

Volta o segundo tempo e aquele filme de sessão da tarde, repetido, mas em castelhano ou portunhol brabo. E Jackson Martinez, do Porto, acabou fazendo um gol espírita, marcando o três a um, quando a retranca grega dava sinais de cansaço. A impressão é a de que os colombianos vão passar de fase. Sem muitos sustos. Muito embora, no finalzinho da peleja, o espanto: a Grécia faria o segundo gol, de penalti. E o jogador grego, na comemoração, fingiu quebrar uns pratos na cabeça do treinador português. Foi a senha para o estádio virar uma cantoria louca...

Andam a dizer que o tal jogador pode até ser penalizado pela Fifa. Porque a comemoração desencadeou uma algazarra de proporções colossais... pratos...trac...trac...traaaac....trac....traaaac... turk....

Colômbia 3 x 2 Grécia (Falcão Garcia - 2, Jackson. Samaras e Karaugonis)
Mineirão. Beagá. 14.06.2014 

E quem não conhece, conheça: Impedimento - http://impedimento.org  
 

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Os calouros e as meretrizes idosas.




Descendo as escadas de meu avião no Santos Dumont, o mais charmoso aeroporto do mundo suspiro e me pergunto pela centésima vez se aquela é a primeira jornada até a realização de um de meus maiores sonhos: testemunhar uma final de Copa do Mundo entre o escrete canarinho e nuestros hermanos argentinos?

 
Sem tempo para perder, me mandei para o velho Adonis, afinal de contas, o Rio, mesmo no frio é quente. O Benfica, onde o Rio é mais português, fervilhava de gente naquela tarde, e eu, trajado com a minha camiseta do meu querido Rosário Central tratei de me perder numa mistura de carregadores da CADEG (um deslumbrante entreposto de secos e molhados) de folga, velhos frequentadores e um grupo de peladeiros do São Cristóvão, campeão carioca de 1926. Caldeiretas, bagaceiras e bolinhos de bacalhau eram consumidos e eu tentava me lembrar que a minha razão de estar lá era cobrir a estréia da poderosa Argentina contra a estreante Bósnia e Herzegovina, no fim de tarde, no templo-mor do futebol.

 
Com o torpor causado pelo engasgagato português que bebia, flashes vinham à minha cabeça sobre esquadrões argentinos repletos de heróis que eu já tinha visto em outras copas, que tinham me emocionado e que num lapso de segundo.....tinham naufragado. Maradona, Caniggia, Redondo, Verón, Saviola, Aimar, Simeone, Batistuta, entre outros, sempre eram soberbos, divinos, até serem derrubados por algo aparentemente inexplicável.

 
O panorama agora era bem menos alentador; Messi era basicamente toda a esperança de um time que tinha o inseguro Romero no gol, a defesa sendo sustentada pelo jurássico Coloccini, um meio de campo razoável com Mascherano, Gago, Di Maria e Pastore e no ataque, ele, Lionel e o vascilante Kun Aguero.

 
Quando o cheiro da bagaceira já era insuportável, tomei o rumo do velho Maraca com direito a uma paradinha na Salete para comer uma empadinha de camarão e tirar a nhaca. Entrando no bar escuto uma saudação “canalla cagón”, bradada por um argentino imenso com a camisa do Boca no meio de um bando enlouquecido. O susto foi aquietado por um largo sorriso e um abraço caloroso. Agora eu era parte de uma trupe que ia junta para o estádio.

 
Uma massa humana bizarra se formava e se transformava numa mancha imensa na frente do Maraca. De todas as partes surgiam camisetas e adereços de Boca, River, Independiente, Racing, Quilmes, Vélez e muitos outros times, criando um mosaico humano fabuloso, que cantava musicas como mantras.

 
Dentro do estádio, uma curiosidade natural com a seleção da Bósnia e Herzegovina, a única seleção caloura deste mundial; a seleção de um país surgido após uma guerra genocida ainda na década de 90 e que por isso povoa mais o imaginário de todos com sua dor do que com a sua beleza.

 
Começa o jogo e o que se vê é uma seleção Bósnia marcando de maneira muito forte a seleção Argentina, que permanece encurralada por 20 minutos em seu campo de jogo até que em uma troca de passes entre Messi e Gago, Messi deixa Di Maria livre para fazer Argentina 1x0. Mal recomeça o jogo e, numa arrancada brusca, Lionel sente uma forte fisgada e tem que ser substituído por Lavezzi. Pressão fortíssima da Bósnia até que num cruzamento perfeito, Dzeko sobe mais do que Zabaleta e empata o jogo, 1x1. Comemoração tímida da maior parte do estádio, brasileira e uma centena de bósnios.

 
Rola o segundo tempo e a Argentina, mesmo sem Lionel, com o alento de sua torcida, toma conta do jogo. Mascherano marca duramente Pjanic e a bola rola de pé em pé no meio campo platino, evocando por alguns instantes os espíritos de Lousteau, Di Stéfano e Pedernera. Faltava, entretanto o gol, a finalização, o cara. Nessa hora, num lance apoteótico, recebendo a bola de Lavezzi, Aguero entortou dois defensores e fuzilou a meta bósnia marcando 2x1 para a Argentina. Quatro minutos mais tarde, aproveitando uma bola mal espalmada pelo arqueiro bósnio, o mesmo Kun tocou com tranqüilidade para sacramentar o resultado final de 3x1 e, em seguida se dirigiu para a tribuna em que estava seu ex-sogro e desafeto Maradona, fazendo sinal de silêncio. O jogo, no fundo tinha sido mequetrefe, mas a ordem natural dos fatos não tinha sido mexida.

 
Final do jogo e a torcida cantava a plenos pulmões, parecendo nem se lembrar mais da tíbia situação de seu maior ídolo, Messi. O mantra tomava conta do Maracanã e, enquanto os brasileiros iam embora, acabei me encontrando com o meu desconhecido amigo com a camisa do Boca e sua turma. Descobri que se chamava Juan Domingo e combinamos de ir festejar na feira de São Cristóvão.

 
A noite já corria, o forró tocava com força, os argentinos cantavam, bebiam e enfiavam a cara na cachaça, quando eu percebo a chegada de dez sujeitos vestidos com a camisa do Vasco da Gama que, pasmem, se juntaram à bagunça e conosco festejaram. O mundo, meus amigos, tem jeito sim.



Resultado final : Argentina 3x1 Bósnia e Herzegovina 
(Di Maria, Aguero, duas vezes e Dzeko) . Maracanã. 
15.06.2014

Álvaro Larrabure Costa Corrêa
(Um dia poemaram para nosso Ogrito, lá nos Bolonistas... Um cordel tão lindo quanto o cara: http://osbolonistas.zip.net/arch2005-11-01_2005-11-30.html#2005_11-18_16_52_04-5048921-29  

Anotações em Guardanapo sobre Escretes Possíveis


segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Sobre caranguejos e vitórias.



Sobre caranguejos e vitórias.

Cheguei ontem em Fortaleza, capital que não conhecia, um curto discurso bem ensaiado contra a pergunta do taxista:

“Para qual hotel, senhor?”
“Nada de hotel: caranguejo”.
“Opa, qual restaurante, senhor?”
“Algum bom, barato e feio”.

Não me arrependi: passei minhas primeiras horas em terras de Iracema no Marcão das Ostras, atacando a golpes de martelo infortunados crustáceos.

Porque, senhores, comer caranguejo é a ação mais brutal, constrangedora e prazerosa que podemos fazer vestidos. Marretinha em punho, desferindo pauladas e lançando rubras cascas pontiagudas contra vizinhos de mesa; sugando feito um tamanduá disfuncional a parca e deliciosa carne branca do interior de perninhas cabeludas; abrindo a cabeça do bicho e devorando, misturada à farinha, uma gosma marrom, meio gordura meio cocô. É talvez a única refeição em que temos de matar – com crueldade indescritível – o animal depois de cozido.

Acredito que se os extraterrestres, ao invadirem a terra em busca de tesouros escondidos, toparem com um camarada atacando um caranguejo, voltam imediatamente, aterrorizados.

Mas não é pelos caranguejos que estou aqui nesta linda capital, onde todos os nativos – à exceção dos comediantes profissionais – são engraçadíssimos. O que me traz aqui, senhores, é a peleja entre Uruguai e Costa Rica, válida pelo inacreditável grupo D desta Copa.

A euforia que cerca a seleção celeste, sensível em cada boteco, em cada banca de jornal, em cada padaria, na calçada que beira Iracema, ultrapassa a maiúscula campanha de 2010 ou a fase atual de Cavani. A euforia ultrapassa esta Copa e o próprio futebol. Ultrapassa o fantasma de 50. A euforia, senhores, chama-se Mujica.

A simples possibilidade de Pepe comparecer ao jogo, anunciada com alarde pela imprensa, fez a cidade ferver. Todos querem conhecer o velho guerrilheiro, tocar aquela aura que une a bravura desmesurada à doçura dos que já sabem o caminho certo. O homem, que vem transformando de forma tão linda seu pequeno país, também tem mantido vivas as hortinhas de sonhos de que há muito não cuidávamos.

Entonces, no dia do jogo, lá estava eu, a caminho do Castelão: uma leveza unia a multidão que caminhava a pé. Jovens senhores esquerdistas de camisetas vermelhas; jovens felizes de camisetas coloridas de amarelo, verde e preto; senhores austeros de camiseta azul. Uma leveza nos unia.

E o jogo não decepcionou.

Suárez e Cavani experimentam de fato um momento mágico. Diego, um capitão que empresta coragem à equipe a cada grito, chutão ou botinada. Do lado costarriquenho, a dignidade do coadjuvante que entende sua situação e só almeja não aprontar na festa alheia. Ruiz não jogou mal, assim como Bolaños ou Saborío. Jogaram bem, mas não alcançavam a dimensão de sonho que aquela partida exigia.

E enquanto procurávamos por Pepe na audiência, a Celeste marcava seus três primeiros gols nesta Copa. O craque do Liverpool marcou um; o do PSG, os outros dois - desde já se inscrevendo para o título de artilheiro da competição.

A Celeste poderia ter marcado outros tantos. Poderia, teve chances. Mas não o fez. Os 3 X 0 foram suficientes para mostrar que Itália e Inglaterra têm com o que se preocupar.

E mostraram ainda mais: que é importante avançar. Que é fundamental a vanguarda. Mas que também é importante dosar o ritmo da luta, de forma a garantir cada conquista com a benção popular. É a única forma de não acabar cedendo ao atraso e comprometendo as vitórias que importam. O avanço inegociável. A benção da rua.

Soubemos mais tarde que Pepe não compareceu à partida. Soltou uma daquelas suas curtas e mortais tiradas sobre o preço dos ingressos. E foi visto, com sua adorável Lucía, jantando na Palhoça do Caranguejo. Não usava o martelo, mas aquele alicate que permite dosar cuidadosamente a força.

Demetrius Cruz

Uruguai 3 X O Costa Rica (Edinson Cavani, duas vezes, e Luis Suárez)
Fortaleza, 14.06.14