Mostrando postagens com marcador Senegal. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Senegal. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 29 de junho de 2018

Trave de chinelas


Lá pelos idos de não sei quanto, o critério de desempate para os jogos do Torneio Início - um campeonato festivo que marcava o início do campeonato paulista, com jogos de meia hora, num único dia, uma verdadeira macarronada de domingo, em partidas eliminatórias do tipo perdeu tá fora - eram os números de escanteio. O argumento era que o escanteio comprovava que o time estava jogando no ataque, procurando gol, então, no desempate, escanteio era gol.

Não sei se a regra do torneio Início era boa. Mas era oitocentas e quinze mais mais lógica e prudente que esta regra safada que a federação internacional de futebol associado tem adotado: a do "Jogo Limpo". Nas competições organizadas pela federação, premia-se quem tem menos cartões como critério de desempate. Obviamente, a regra macabra foi utilizada para definir um dos classificados o mais jururu para as oitavas de final nesta copa, na vaga disputada entre Japão e Senegal. Os japoneses ficaram com a vaga por ter tomado dois cartões amarelos a menos que os senegaleses.E o que aconteceu? Os asiáticos, sabendo do resultado da partida entre Senegal e Colômbia, mesmo perdendo o confronto com a Polônia, passaram os últimos cinco minutos num verdadeiro toco de lado recebo de volta. Uma ode ao oportunismo de quintal, aquele da grama do vizinho.

No fim, a seleção que praticou um joguinho mequetrefe de ocasião acabou se classificando na regrinha do "fair play", num contrassenso típico de fazer propaganda de refrigerante antes da matéria que alerta dos riscos da obesidade infantil. Ou, propaganda de banco e logo depois aquele analista cu de ferro vem explicar do problema da inadimplência contribuindo para os índices débeis da economia.

E é óbvio que a imprensona do mundo resolveu tacar o tacape nos japoneses, tratando a manobra do time como laranja podre, que aquele joguinho de engana nos últimos minutos foi uma manobra aviltante, mais terrível que xingar a mãe. Mas, carambolas cósmicas, porque diachos existe uma regra dessas? O amarelo, o cartão, é um sanção e se insere dentro das possibilidades da partida. O amarelo recebido numa partida duríssima, por causa de uma falta que impediu o prosseguimento da jogada, não pode se equipar com um amarelo por comemoração de gol. Aliás, amarelo em comemoração de gol é outra dessas cretinices de emoldurar. O amarelo é um sinal de alerta, uma admoestação preliminar, mas que leva em conta única e exclusivamente as condições objetivas e subjetivas, o drama e a miséria, daquela partida singular, que nunca mais se repetirá. 

Melhor o critério do escanteio. Pelo menos se premiaria quem chegou na última linha de defesa da cidadela adversária, tentando ganhar o pote de ouro do castelo. Melhor ainda era chamar japoneses e senegaleses para um encontro no ginásio coberto da escola pública mais próxima, para fazer um "vai a um", gol caixote, meio campo, seis de cada lado, sem goleiro mas com a regra de no mínimo três toques. Uma regra simplesinha, que toda criança que jogou futebol sabe identificar.

Ou, sei lá, classificar o Irã. 


28 de junho, 2018. Japão e Polônia. Colômbia e Senegal. Inglaterra e Bélgica. Panamá e Tunísia.



segunda-feira, 25 de junho de 2018

Quando o marreco sorridente também gritou gol!


Era domingo. Último dia da segunda rodada da copa. Nas duas primeiras rondas, neste formato de grupos de quatro, são muito maiores as chances do lúdico, do brincar. Depois, tudo ganha ares de seriedades excessivas, classificações, epopeias, desastres, glória, fracasso, vexame, sete a um, dinastias e bebedeiras. Mas no comecinho, não. Ali naqueles primeiros momentos temos os sonhos de um Panamá campeão do mundo, de um gol antológico, de passes com azeite, bolas com açúcares, planos, brinquedos. Com jogos todos os dias, muitos jogos, muitas bolas, muito assunto. O deleite. 

Sim, há na segunda rodada as desclassificações prematuras - ninguém deveria ser sumariamente eliminado na segunda rodada e as regras perfeitas um dia levarão isso em conta nalguma fórmula mágica. Mas, a rigor, todos tem chances. Até o time mais estrombólico, caricato ou sovina. É um grande barato, basta gostar de picolé. Eu gosto muito de acompanhar estas rodadas ouvindo jogos pelo rádio. Há uma fantasia nas narrações pelo rádio que nos transportam para mundos paralelos. Ouça o centésimo gol de Rogério num desses videozins de vocêtubo e percebam que para cada narrador, um desenho, uma mágica, um conto. Até parecidos, mas diversos. O rádio, o futebol pelo rádio, vai muito além da imagem televisionada: é a imagem imaginada.

De uns tempos para cá, com o advento dos aparelhos de telefone móveis, pequenas máquinas de computadores muito mais possantes que os PCs dos tempos remotos de colégio, há aplicativos e possibilidades de conhecer e escutar rádios de todos os lugares do mundo. Este sempre foi um sonho que acalentei, toda vez que tentava colocar as antenas dos radiotransmissores que passavam pelas minhas mãos e tinham a frequência das "ondas curtas". Com o celular, as ondas curtas funcionam mesmo. Basta um sinalzim das internetes.

Voltando ao domingão, fui ao parque com minha filha pequenina no horário do jogo do Senegal. Fui de carrinho e pude num plano infalível ouvir trechos do jogo. Um fone num ouvido e outro pronto para ela. Só quando ela quis dar milho e piruá para os patos é que deixei os fones. A menina adentrou corajosamente ao setor de patos e galinhas, galos e pintinhos do parque e eu resolvi que era melhor marcar de perto a atacante do meu próprio time, já que ornitologia é uma ciência que demanda total atenção e bicada de pássaro dói mais que chuteira de trava na canela. Bom, a menina andou para cima e para baixo, correu, correu de novo, subiu com a boneca para lá, para cá, conversou com o baile todo e, obviamente, se cansou. E pediu colo.

Lá pelas tantas ela estica as mãozinhas para os fones de ouvido. Estica, resmunga e só para quando eu entrego para ela. Automaticamente, ela coloca os fones nos ouvidos dela. Sem som, porque estavam desconectados. Reclama, aponta para o telefone, resmunga, chora. "Tá filha, vou ligar."

Antes de procurar alguma música, o celular estava conectado a uma rádio de Dakar, Senegal. Senegal e Japão faziam seu jogo na copa. Não entendia nada. Era um "Senegale hã Japonaise hã" que imaginei ser um a um o placar. O fato é que o narrador desembestou a gritar exatamente na hora que a menina recolocava os fones, desconfio que foi o segundo gol senegalês: "Futebó! Futebó, papai". E sorri gostoso.

O pai? O pai quase evapora naquele sorriso. E colocou o outro fone tentando descobrir se tinha sido mesmo gol...


24 de junho, 2018. Senegal e Japão. Inglaterra e Panamá. Colômbia e Polônia.




quarta-feira, 20 de junho de 2018

"Aperfeiçoando o imperfeito"


Ouvi uns pedaços do jogo de Portugal, numa estação de rádio lusitana, pelos fones de ouvido no celular. O telefone celular é uma invenção do demônio, todos sabemos. Mas o tinhoso é sempre contradição: criou algo para nos amarrar definitivamente ao trabalho, nos dar a sensação de estarmos ligados, conectados, plugados, por toda a existência da bateria, mas, por outra ruela nos deu os aplicativos de música e as rádios. Uma no cravo, outra na ferradura. Como na copa: Um Portugal e Espanha dum lado,um Coréia do Sul e Suécia, benzadeus que partida árida, doutro.

Os narradores portugueses, eles narram os jogos em dupla, assim como os uruguaios, torcem descaradamente e sem pudores para seus selecionados. É estranho quando comparamos com as nossas narrações mais famosas, que exageram num ufanismo que não podemos chamar de torcida... e não sei muito bem explicar o que é. A vitória parece que vem por causa de algo natural, inato e a derrota vem porque alguém cometeu algum crime. Os portugueses falam das naus perdidas. Nós falamos de como se perderam as naus. É uma linhazinha tênue mas é barbante. Nos jogos da seleção talvez fosse melhor escalar sempre o Silvio Luis e os seus bordões: "pelas barbas do profeta". Ou o Osmar.

O único jogo que vi quase inteiro nesta copa foi o Portugal e Espanha. Um belo jogo de futebol. Nos demais, o televisor ou o rádio ligado, mas sempre fazendo algo em paralelo. A copa, como encanto paralelo. Perdi muitos pedaços de jogo e vi alguns gols só em videoteipe. Como os de hoje. Não sei, então, nem tento, estabelecer análises de tática, técnica, desempenho. Aliás, estas análises andam chatas por aqui. Tentar criar sistemas lógicos que expliquem resultados, com índices de posse de bola, de chutes a gol, de onde a bola foi chutada, gráficos e mais gráficos, coloridos, bonitos. Não sei estas análises dão conta do jogo. A beleza de uma retranca, e como são belas as retrancas, quase nunca é observável dentro desses critérios matemáticos. Cannavaro nunca teria sido o melhor do mundo numa copa se os critérios de análise fossem só os de "show do intervalo".

Me disseram do Irã na partida com os espanhóis. Deve ter sido uma retranca lindíssima. Assim como foi a da Islândia. Nosso problema é tratar o futebol como obrigação de espetáculos e malabarismos circenses, quando na verdade são os imprevistos, os impossíveis, os incrédulos que dão perfume a este jogo, um dos poucos onde o melhor nem sempre ganha. Ninguém se apaixona pelo futebol numa partida do Barcelona ganhando com oitenta por cento de posse de bola. A gente pode admirar, achar um feito incrível, uma obra de arte, ter o gozo. Mas o que apaixona, aprisiona a bola no lado certo do coração, foi o dia em que o Mineiro recebeu um passe milimétrico do Aloísio Chulapa, entrou na área e caixa, time campeão contra um outro aparentemente muito superior. É a vitória do Valladolid num único ataque, nos seus dez por cento de posse de bola. É a vitória de Camarões na abertura da copa. E a dança do Senegal. A paixão só pode ser despertada num dia de vitória impossível. É o caneco do Leicester. É o Olaria do Afonsinho. Depois de instalada a paixão, a gente administra, transforma a paixão em amor, resolve querer ganhar sempre, aplaude e exige o bonito. Mas durante uma copa a gente percebe que amar é importante, mas paixão.... aaaaaaah..... paixão é foda, é bola na rede, é o salve-se quem puder na zona do agrião...

Na volta para casa, tentando recuperar os placares que perdi - num perdi muita cousa pelo jeitão de um a zero magrinho de todos eles - percebi que no meu bolão cravei Irã 1 x 1 Espanha. De certa forma, ainda tem paixão neste navio.


20 de junho, 2018. Portugal e Marrocos. Irã e Espanha. Uruguay e Arábia Saudita.





terça-feira, 19 de junho de 2018

O jogador que falta a seleção



Eu gosto de copa. Mas tem muitas cousas que eu não entendo. Uma delas, pujante, é o diacho de interromperem as partidas da série A do Brasileiro, a Libertadores e a Sulamiranda. Abraçados aos meninos e com a menina pulando entre nós no sofá, me perguntam os dois: "quando é que o São Paulo vai voltar a jogar?". Já estou na fase de não saber responder a todas as perguntas deles...

Alguns vão dizer que não dá para competir com o certame mundial, que seria uma espécime de cereja oficial da federação que organiza a bagaça toda. Outros irão dizer que não teria como porque exauriria as pessoas com tantas informações sobre o futebol. Outros, os diretores da empresa que monopoliza as ideias do país - essencialmente esses, acham que iam ter que contratar jornalistas, equipes de esportes e equipes operacionais, para poder dar conta de eventos simultâneos como estes e ficaria muito oneroso. Eu, aqui do breu das tocas, acho tudo isso cascata, lorota, falta de comprometimento ou o excesso doutro comprometimento qualquer outro.

Começa errado, por direitos de transmissão comprados a preços exorbitantes, que uma única empresa detenha o poder de transmissão sobre os jogos de todos os campeonatos. É o capitalismo de merda que o país está acostumado desde sempre, onde a "competição" só interessa no quinhão alheio. Não sei porque os órgãos de proteção ao mercado simplesmente não proíbem este tipo de concentração de atividade econômica e cultural. Devia ser regra: transmite o Brasileirão, não transmite a Copa. Transmite o Paulistão, não transmite o Carioca. Tem contrato com o Corinthians, não tem com o Flamengo. Transmite Olimpíadas, não transmite Fórmula Um. Simples assim. Concentração é um bode, não é? Mas nosso liberalismo é  herdeiro de capitanias, neto de feudos, bisnetos de castas. Ou uma outra saída, linda de marrédessi que seria liberar o sinal para todo mundo. Eu, aqui de casa, transmito o que quiser.

E segue errado, porque a pausa no campeonato interrompe o coito. Lembro de uma Libertadores que o São Paulo enfrentou o Cruzeiro.Estávamos com os mineiros entalados porque tínhamos sido eliminados num ano anterior, sem chutar uma bola no gol em cento e oitenta minutos. Era eliminatória, o time estava naquele vai não vai. Mas antes da série, pudemos inscrever novos jogadores. Inscrevemos Fernandão. Fernandão fez história no Internacional de Porto Alegre, uma bonita história, e no Goiás. Pois bem, Fernandão fez duas partidas monumentais, Messi no chinelo, acabou com o Cruzeiro, tirou o nó e prometia mundos e fundos. Pausa para copa. Nunca mais. Fernandão teve passagem breve, nem titular foi durante o resto do período que ficou no tricolor. Perdeu o trem. Fernandão era um cara legal. 

Escrevo estas linhas como um desabafo, preocupado, com os rumos da prosa. Nenê, nosso sete, mais de trinta e cinco de RG, anda fazendo partidas de gala e garbo neste Brasileiro. O São Paulo fez mais pontos em doze rodadas do que em todo o primeiro turno do ano passado. Fico aqui matutando se esta pausa para a Copa não vai tirar esta adrenalina de nosso artista e voltará macambúzio destas férias forçadas...

Ao menos neste ano a Série B não parou. O Fortaleza segue fazendo uma campanha de Canal 100 e agorinha a noite estavam jogando Avaí e Guarani, na Ressacada. O estádio estava animado. No Guarani, Édson Silva desfilava na zaga. Édson foi,por um curto período, é verdade, o maior brasileiro vivo quando ocupou a bequeira do São Paulo: foram um ou dois jogos messiânicos. O cara chegou a cabecear o chão lutando por uma bola. Do lado do Avaí, também na zaga, Betão, ex Corinthians. Foi de Betão o gol que terminou com a fase mais bonita do Majestoso, onde bastava o Corinthians jogar com o São Paulo para acabar em crise: o 5x1 na estréia de Autuori, as quedas de treinadores, o show de Amoroso naquele jogo que teve que ser refeito pelo rolo da arbitragem. No ano do rebaixamento, logo após o São Paulo ganhar o caneco de forma antecipada, Betão fez o um a zero que tirou o Corinthians da fila. Depois daquele jogo o Majestoso anda dando mais dor de cabeça do que resultando em pão na chapa.  

Quando era menino, gostava também de jogar bola nos dias da Copa. O monotema era bálsamo. Desliguei o televisor, estava dois a zero para o Avaí. Os meninos dormiram, a menina dormiu, a casa em silêncio, vim escrever. Procurando os gols dos jogos de hoje na copa, quase li uma notícia da contusão do Neymar. Antes de abrir a aba, num canto, o nome de Aguirre pula na tela e me chama: "São Paulo faz treino com três zagueiros, Aguirre relembra os tempos vitoriosos de Muricy: Se é o melhor para o futebol, não sei. Mas é o melhor para o São Paulo.". Me emocionei, confesso.  


Em tempo: Avaí e Guarani empataram, um elétrico 3 a 3.

19 de junho, 2018. Japão e Colômbia. Senegal e Polônia. Egito e Rússia.