Rússia e Coréia do Sul. Arena Pantanal. Os russos, com seu
novo império a brotar, e a Coréia do Sul, com sua velha cicatriz. Os jogos de
uma copa tem sempre histórias paralelas, que se multiplicam no infinito. Dos
garotos ouvindo o jogo numa saída de escola. Das garotas colando figurinhas em
álbuns. Será que na Rússia tem figurinhas da Copa? Confesso plenamente que se
fosse a União Soviética eu iria torcer muito. Para a Rússia, não. Fico com a
Coréia, sua vibrante torcida, seu uniforme multicolorido – só me faltava eles entrarem
de branco na peleja...
Talvez se a União Soviética tivesse ganho copas do mundo de
futebol o tolo do Mikhail nunca tivesse existido... penso bastante nisso. No
mundial que deveria ter sido de Yashin. E não foi. É absolutamente verdadeira a
constatação de que o regime soviético foi um pesadelo. Principalmente durante
Josef e depois. Mas não é nisso que penso. A reflexão é sempre naquilo que
poderia ter sido. Da Estação em diante. Tivessem ganho a copa do mundo seria
diferente, aposto. Porque a copa é um gol de Oscar contra Dino Zoff. E quem viu
aquela bola entrar sabe que é possível mudar a cor do mundo. A roda toda.
Também sonho com o gol da Coréia contra a Alemanha, em 2002.
Sim, porque se é verdade que contra Espanha e Itália os sul coreanos tiveram
uma mãozinha da arbitragem, também é fato que nenhuma torcida merecia tanto uma
copa do mundo como aquela maluca torcida coreana. Com curiosidade, busquem lá
os arquivos do VocêTubo, das matérias de periódicos. A Coréia vibrava tanto com
a seleção que seriam capazes de dinamitar os muros todos duma só vez com um gol
daquele zaqueirão que hoje é o treinador dos caras.
Mas o fato inexorável é que a copa do
mundo de hoje não tem soviéticos nem a torcida sul coreana em massa,
cantarolando plenos pulmões. O jogo deve ser mais um daqueles que completam
tabelas de copa, que servem para casas de apostas, que derrubam bolões. Que lá
fora do estádio está um país que perdeu a imensa possibilidade de criar novas
rodas, de vibrar torcidas para derrubarem muros, de olhar pra frente com gol.
Tudo virou uma enorme e imensurável nuvem de mundo adulto, melancólica, dura e
fria.
A sorte é que os coreanos não estavam
nem aí para as minhas digressões diletantes. E massacraram os russos, com três
gols de Park. Aposto e ganho que se aquele time da Coréia do Norte tivesse os
irmãos do Sul em 66, na copa do apito inglês, até hoje o mundo seria outro, com
outra geografia. Inclusive no futebol.
Rússia 0 x 3 Coréia do Sul
17/06/2014 – Arena Pantanal, Cuiabá.
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