quarta-feira, 12 de março de 2014

Turbantes, a turba


Na verdade, quando a gente vai a um jogo de copa do mundo a gente não espera uma vitória épica, um golo magistral, uma epopéia, uma virada, uma galhofa. Evidente, quando a gente vai num jogo do time que a gente torce, a gente... torce. Mas não falo desta expectativa. O rumo da prosa é outro.

Numa copa é a arquibancada que buscamos. Mais que o jogo. Quem se lembra da série interminável de partidas bizonhas, horrorosas, mequetrefes, jejum de faquir que se amontoam pelas copas de outrora. Só na África do Sul podemos lembrar de uns dois ou três jogos que realmente valeram a pena, futebolisticamente no campo. Até a Espanha teve uns jogos saco vazio, naquele toque de lado até o dia amanhecer que deixam até Buda de fastio. E se formos mais longe, nas copas da Alemanha, na de Japão e Coréia, na da França... minha nossa senhora da cafeína... várias pelejas são de dar sono em bule de café.

Mas lá nas arquibancadas, não. Existe, naquela mágica entre o que sonhamos e o que é, uma imensa nuvem de possibilidades. Os ingressos tem preços absurdos, pornográficos. Os estádios tem estruturas para deixar tímidos os pobres, os desvalidos, os de sempre. Mas mesmo assim são nas cores de uma arquibancada que iremos encontrar um pouco da razão de ser real de um certame mundial. É verdade que alguns enxergam o “exótico” e não a diversidade, mas há bestas em qualquer lugar.

Irã e Nigéria, no campo, há de ser sempre uma incógnita. De um lado a sempre esperada reviravolta africana, sempre repletos de entusiasmos e esperanças mas que redundam em decepções e derrotas inexplicáveis. Mas a Nigéria tem um time forte, habilidoso e capaz de sonhos, como de outras vezes. Será desta vez? Não sabemos. E do outro lado, o Irã, este país que é o inimigo número um da classe média abobada ensinada – ou domesticada, sabe-se lá, pelo mais fino discurso da tal democracia ocidental. Mas um país que pouco sabemos – e pior, que muitas vezes nem queremos saber.

Foi bonito ver, na torcida do Irã, uma faixa com o rosto do ativista negro americano Mumia Abu Jamal, preso desde sempre, lembrando que a tal democracia ocidental também é uma forma de opressão, mais dissimulada, mais chique, mais perversa. A democracia ocidental é como o hamburguer da patrocinadora, “amo muito tudo isso”.

E nesse jogo incógnita, de que pouco sabemos de antemão, que temos a Nigéria como favorita, qualquer resultado é possível. Na verdade, a vitória dos africanos foi construída com um bom futebol na fria Curitiba. Sinal de que podem passar de fase e ousar. Tomara, o mundo precisa da África. A Copa, também.

Mas foi o gol do Irã, ao final do jogo, que nos deu a certeza de que a copa pode ser um grande espetáculo de celebração. Nas arquibancadas, dançavam os poucos africanos e os poucos iranianos, ao som de uma batucada improvisada, numa letra em que podíamos ouvir um pouco de paz.

Nigéria 3 x 1 Irã
Curitiba, Estádio do Atlético, 16/06/2014. (não anotei o nome de quem fez os gols, estava dançando também)

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