O fato
é: Cristiano Ronaldo está contundido. Grave a lesão. Sabe-se lá
se jogará a copa. Um desatre de proporções bíblicas. Porque
alguns gostam, outros não, mas é absolutamente inegável o talento
do gajo. Até para torcer contra, espesinhar, fazer, fazer mandinga.
O inexorável é que o portuga tinha que jogar, teria que jogar. Uma
copa sem craque é como aquela pratada de macarrão a bolonhesa sem
um cadinho de queijo. Ou cerveja sem álcool. Vou mais longe: dor de
cotovelo, sem Lupicínio.
Estávamos
todos cabisbaixos. Numa tristeza profunda. Afinal, Salvador não é
uma cidade para desamores. Lá só nos cabe viver e isso não é
pouco. Alemanha e Portugal era o jogo mais esperado daquela primeira
rodada.
A
Alemanha, pelo favoritismo, pelo futebol plástico, talvez até mais
sulamericano que os times de cá. Muito embora saibamos que a
Alemanha não ganhará a copa, algo que todo o monumento do
Pelourinho sabe. O dia que a Alemanha ganhar uma copa no continente
americano, fecharemos o bar. Não sobrará mais nenhuma verdade
absoluta, nem Eva, nem Adão, nem manteiga. Será o triunfo da
margarina.
E
Portugal, se favorita não é, tem o melhor jogador do mundo. O cara
que tem a média de um gol por jogo, assombrosa. Sim, tem lá seus
isso e aquilo, e cabelo, e luva, e comercial, e shampoo, e cínico,
e... mas deixemos esses “e”s de lado. O cara é estupendo. Sem
contar que Portugal, nossa madrasta, sempre conta com alguma simpatia
brasileira... Sabe-se lá.
E foi
quando eu, o Deco, o Zécons e o Ogro tivemos a grande ideia. Só o
Chico foi contra, que ele não gosta mesmo do Cristiano Ronaldo, de
jeito algum. Naquela beberagam camarada perto do farol, num calor de
assar, enquanto confabulávamos sobre a copa, a vida, o cinema e
sobre a última pesquisa DataFolha que indicava a vitória de Chico
Alencar já no primeiro turno, Dequinho, sempre ele, solta a cousa:
“Pai Vavá.” Todos entenderam, na hora.
Quem
assistiu ao filme “Boleiros” do Girgetti sabe do que estamos
falando. A mística toda foi muito lógica: levaríamos o CR7 para
uma benzedeira no caminho para Porto Seguro, indicação do Pedrão.
O plano era simples: Usaríamos nossas credenciais de imprensa,
entraríamos na concentração lusitana. Zecão ficaria no carro, um
Samara branco soviético todo mexido. Enquanto o Chico ficava na
espreita na vigilância – ele só aceitou esta singela participação
no episódio porque temeu que os amigos fossem pegos pela polícia e
enquadrados em alguma lei de segurança nacional que resultaria num
forró danado, gente presa e aquela parafina toda -, o Ogro fingiria
uma entrevista com o craque. Durante a entrevista, soltaria a pérola:
“Rapaz... não queria incomodar não. Mas conheço uma senhoura que
tem uma babosa milagreira para cabelo... Nunca mais vais ter que se
preocupar com o ph.” E coçaria o cavanhaque, que era a
senha. Deco, com uma peruca lindíssima, entraria em cena. Eu, que
fingia ser o cara das filmagens, soltaria a pérola: “Ronaldo, olha
o cabelo daquele cara. É a babosa.”
Nem
preciso contar. Cristiano Ronaldo deu um jeito de fugir das tramelas
da concentração e nos encontrou no Samara. Rumamos para a
benzedeira. Não preciso explicar mais nada.
Alemanha
2x0 Portugal. Cristiano Ronaldo não jogou. Um bafafá tremendo na
imprensa internacional, mas desconfiavam que ele estava tomando todas
e mais algumas num boteco perdido em Caraíva, defronte à “Fonte
dos Mentirosos”. Joelho curado. Cabelo impecável. E no coletivo na
praia fez trinta e dois gols, em quarenta e sete minutos de pelada.
E foi o
Chico, cético, quem soltou a frase: “Portugal tem muito mais
chance agora. O cara se benzeu de verdade....”.
Fonte Nova, 16/06/2014
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